de ROBERTO BASÍLIO FIALHO
Na historia do pensamento moderno o encontro de diferentes áreas do conhecimento como a
filosofia, ciências sociais, ciências naturais e artes tem introduzido novas idéias sobre criação
artística em dança. Estes encontros tem ocorrido de formas tão incisivas que tem deixado de
lado antigos pressupostos postulados pela religião e outras corretes mais tradicionais do
pensamento ocidental sobre a arte, pois são incompatíveis com as novas condições e
ferramentas da contemporaneidade. Apesar da filosofia estar atrelada com o surgimento da
ciência, estas são linguagens completamente distintas. A ciência fortaleceu-se com o
refinamento de sua técnica cada vez mais buscando o aprofundamento no uso de suas técnicas
através de processos operacionais, organizacionais e de controle das leis físicas e químicas que
regem as possibilidades de compreendermos as facetas da vida no universo. A arte é uma
possibilidade de entendimento sobre como lidar com a vida, suas certezas e incertezas. Assim,
como um traço da arte, consideramos que a linguagem da dança é um legado de conhecimento
sobre o corpo humano deixado pelas civilizações anteriores, através do processo de
comunicação e transmissão contínua dessa arte por gerações. A técnica, a arte e a ciência
podem estar implicadas por terem relação com a criatividade, como os lados de uma mesma
moeda. Mas, apesar de podermos falar individualmente de cada uma delas, entendemos que
esta é uma questão que não deve ser tratada de forma dualista. A compreensão que trazemos
aqui é que a relação que permeia a técnica entre a arte da dança, a tecnologia e a ciência
quando é desenvolvida de forma compartilhada projetam na cultura novas configurações
sociais, movimentos e tendências. O que não quer dizer que essas novas configurações não
trazem problemas. Trazem problemas de novas ordens políticas, metodológicas, teóricas,
epistemológicas. Agora, por exemplo, estamos diante desse pensamento que requer um novo
tipo de análise crítica para compreendermos, explicarmos e revelá-los seus fundamentos
epistemológicos.
Durante muito tempo, a arte da dança se pautou na técnica que nós, corpos humanos,
adquirimos por meio de repetições sucessivas, tanto pelo manuseio de um
instrumento/ferramenta como pelo uso do próprio corpo. As experiências estéticas da dança,
da fotografia, do cinema e do vídeo são revigoradas a partir de sua contaminação pelo
computador, talvez por lidarem com uma cultura de cunho visual, mas principalmente por
apresentarem práticas completamente diferentes, ressignificando a experiência estética. As
linguagens artísticas que antes lidavam com conceitos deterministas e fechados – como o
teatro, a dança, a fotografia, o cinema, o vídeo, a pintura e a escultura – com o movimento da
pós-modernidade artística, a partir da década de 1960 entraram em crise, buscando novas
soluções, para suas práticas já estabilizadas.
No contexto do século XX, a década de 1960 constitui um marco no campo da arte,
particularmente no que se refere aos interesses deste artigo. A arte passou por mudanças
conceituais e estéticas fundamentais, resultantes de uma atmosfera de transformações
mundiais que também estavam ocorrendo na política, na sociedade e na ciência. Foi um
momento para a reflexão e “expansão dos sentidos”, no que poderia significar como arte – a
partir desse período, seriam agregados novos sentidos para as tais práticas artísticas. Na dança
contemporânea a noção de espaço/tempo postulado pela física clássica modificou-se
radicalmente, assim como também outras ideias – de cunho capitalista – passaram a participar
dessa arte como a parte e o todo, continuidade e descontinuidade e simultaneidade entre outros
conceitos.
Apesar de ser fruto da expansão capitalista encampada no seio da racionalidade de
produtividade industrial, que carrega o pressuposto da produção em grande escala, a arte
emergiu naquele momento como expressão coletiva dessa sociedade transitória, dialogando
com a atmosfera de instabilidade e mudança projetadas pelo mundo, que viriam a ser
realizadas na década de 1960. Era a consolidação de uma arte vanguardista, em que a estética
tomaria um rumo diferente do que já havia sido postulado pela “história” para o que seria arte.
As bases instrumentais das técnicas tradicionais seriam adaptadas aos anseios desse novo
contexto. Com a introdução da imagem produzida pela câmera fotográfica, no final do século
XIX, rompeu-se com a abordagem tradicional da manipulação de imagens pela pintura. A arte,
e inclusive a dança, se reinventou com a invenção da fotografia, assim como também com a
introdução da computação gráfica na década de 1960.
é com a fotografia que se inicia, portanto, um novo paradigma na cultura do
homem baseado na automatização da produção, distribuição e consumo de
informação (de qualquer informação, não só da visual), com conseqüências
gigantescas para os processos de percepção individual e para os sistemas de
organização individual. (MACHADO, 2007, p.43)
As experiências estéticas das artes fotográficas, cinematográficas e videográficas são práticas
completamente diferentes, mas, com as novas experiências de composição artística mediadas
pelo computador, desde a década de 1960, novos sentidos têm sido gerados para essas artes.
Durante sua evolução técnica, o computador passa a agregar várias mídias. Mesmo
trabalhando com a objetividade matemática, se tornara ferramenta e instrumento técnico
utilizado na criação artística – o que representa, sem dúvida, um dos fatos importantes que
constituíram a vanguarda das artes pós-modernas. Instaurou-se, nesse contexto, uma arte que
se deu a partir do movimento sincrético de suas imagens, posicionando-se entre o surgimento
do cinema e o computador. Com as tecnologias do computador, é possível atuar com a
objetividade e a precisão na observação de fenômenos. O computador tem flexibilidade para
criar e/ou interferir em imagens, e o desenvolvimento dessa relação com o mundo das artes
tem sido proporcionado pela ciência, que, ao construir uma máquina universal, criou uma
mídia que sintetiza outras mídias. Não é a toa que Arlindo Machado chama atenção para a
questão sinestésica que perpassa a relação entre as artes – a música visual, a escultura líquida
ou gasosa, o vídeo como processual, o cinema eletrônico e a TV digital. A mescla produzida
pelo computador retirou a especificidade de cada mídia para transformá-la em meios de ações
em conjunto. Nesse ambiente de encontros, provocações e vanguardas, as fronteiras que antes
delimitavam esses campos se entrelaçam e se borram, chegando a se confundir. É nessa
atmosfera que a performance ganha força como expressão artística, assim como outros
processos artísticos são desenvolvidos. A convergência desses meios trouxe novas práticas,
causando rupturas e expansões – um exemplo disso é a presença do vídeo em instalações e
coreografias, videocenografia, videoperformances, intervenções urbanas, peças de teatro e
shows de música. Em todos esses casos, o vídeo exerce uma grande importância para as artes
visuais, traz uma imagem instável, múltipla, variável e complexa, assim como o perfil da
sociedade contemporânea. A consequência da disseminação da imagem videográfica é uma
diversificação sem referências fixas de seus conceitos. Essa presença tem invadido e
modificado hábitos culturais, assim como os seus circuitos de exibição e a compreensão desse
fenômeno. São imagens mestiças, construídas a partir de um suporte mediado por diversas
fontes, em que
[...] parte é fotografia, parte é desenho, parte é vídeo, parte é texto produzido
em geradores de caracteres e parte é modelo matemático gerado em
computador. Cada plano agora é um híbrido, em que já não se pode
determinar a natureza de cada um de seus elementos constitutivos, tamanha é
a mistura, a sobreposição, o empilhamento de procedimentos diversos, sejam
eles antigos ou modernos, sofisticados ou elementares, tecnológicos ou
artesanais. MACHADO (2007, p.69-70)
A técnica para interagir com imagens computacionais está impregnada de conceitos derivados
de uma história bem específica, que apresenta ambiguidades e tensões nos seu
desenvolvimento. É determinada por sua mediação tecnológica e pelo desafio do artista em
reafirmar sua postura crítica diante do clichê e da banalização da tecnologia pela indústria de
produção em grande quantidade, traçando um caminho que dialoga com o analógico e o
digital, para compreender o que podemos chamar de novas imagens do audiovisual.
Também a dança tem buscado explorar processos que agregam o “pensamento” da máquina
computacional, desenvolvendo novas articulações criativas a partir disso. O espaço virtual é
um ambiente de atuação para a dança, agora contaminada por novos conceitos sobre os fatos,
sobre as pessoas e sobre os artefatos do mundo. A estética contemporânea das artes visuais,
estabelecida com o desenvolvimento da informática, transita entre a “criação” de imagens que
podem ser consideradas reais e a imagem virtual.
A arte da computação gráfica trata exclusivamente das imagens e ganhou força com o
interesse de cientistas nos feitos e efeitos artísticos emergidas da relação entre a arte, a ciência
e a tecnologia. As artes visuais, ao trabalharem com imagens gráficas, criadas ou modificadas
pelo computador, se desenvolvem numa rede complexa de relações, pontuadas pela presença
da simultaneidade. O padrão que a tecnologia imprime faz artistas buscarem novas maneiras
de interpretar as interfaces interativas usadas para a criação artística. O mercado tecnológico e
a indústria da informática estão enraizados na cultura contemporânea de maneira a desenhar a
vida cada vez mais com a atuação das tecnologias computacionais.
A informação veiculada no computador é de natureza mecânica, manipulável
automaticamente. O que a arte tem tentado fazer, é extrair o máximo de possibilidades
criativas contidas nessas informações. Assim, uma fotografia, além de ser uma imagem, é
também a configuração da aplicação de conceitos químicos e físicos desenvolvidos pela
ciência. Para isso, as linguagens de “programação” de computador, em que a informação pode
ser manipulada e modificada, têm sido desenvolvidas para serem utilizadas não só na imagem
da tela do computador, mas na elaboração e construção de carros, no design de edifícios, etc.
Nas produções artísticas, essas linguagens colaboram para a mutação nas imagens
audiovisuais (assim como para a divulgação de trabalhos, a baixo custo e a longas distâncias).
As artes gráficas visuais são formalizadas entre os anos de 1960 a 1980, ao mesmo tempo em
que o computador é criado e desenvolvido, começando a dar os primeiros passos para sua
popularização (consolidada a partir dos anos 1990). Os conceitos básicos da informática
também começam a ser desenvolvidos, com o esclarecimento sobre os usos do hardware1 e do
software2
, suas funções e potencialidades.
Arte e ciência consolidam sua relação, integrando-se como formas de conhecimento
multidisciplinar, pois ambas tem se pautado pelo experimentalismo onde, cada vez mais
crescem os especialistas e as especializações das áreas seguidos por suas subdivisões. E graças
a crescente institucionalização acadêmica que transformou esses conhecimentos em disciplinas
que propõe atividades metodológicas de ensino e pesquisa, desde então determinam uma nova
postura de atuação, tanto científica quanto artística. Quando a computação passa a interagir
com a informação visual, abre-se um panorama em que artistas e cientistas muitas vezes se
vêem confundidos numa mesma tarefa, num contexto de possibilidades instauradas pelo
computador – como, por exemplo, a possibilidade de deslocar o sentido real de uma imagem
para uma esfera onde podemos pensar que todas as “imagens imagináveis” podem existir.
As imagens produzidas pelo computador são imagens sintéticas; passam por três fases
fundamentais: a transcrição ou descrição da imagem para a máquina, seu processamento e sua
exibição. A partir desse esclarecimento, podemos inferir que toda arte produzida com a
computação depende de vários aspectos e associa uma série de saberes: 1) a formalização da
lógica booleana3
; 2) a teoria matemática da informação4
com o bit – unidade mínima de informação que pode ser controlada; 3) a máquina de Turing5 – precursora do algoritmo, que
viabiliza a execução de programas (tarefas) em um número exato de etapas; 4) a teoria
cibernética de Weiner – que implantou a ideia de controle e autocontrole da máquina, sendo
esta capaz de responder aos comandos humanos através de feedback; e 5) a estruturação do
computador implantada pelo matemático John Von Neumann6
.
Isso significa que tudo o que é criado pelo computador vai obedecer à lógica própria do
computador. Tudo o que é externo ao computador deve ser transformado em algo interno a ele.
A computação gráfica lida com a representação de objetos para sua consequente manipulação,
o que torna qualquer imagem manipulável. Podemos alterar suas partes, afetando outros
componentes ou não. Essa é uma gigantesca contribuição que revolucionou as artes visuais.
A estruturação de uma arte baseada na tecnologia produz experimentos formais com
elaborações metodológicas e demonstrações além do aprendizado de princípios. A arte tem
deixado a tecnologia mais flexível, maleável, acessível. E, aliada à interação, a tecnologia
acaba por possibilitar novas qualidades plásticas e mecânicas. Como característica de seu
tempo, a arte tecnológica pode ser entendida, então, como a referência artística mais avançada
na atualidade, com conquistas que surgem indexadas num espaço/tempo de hibridismo entre a
tela do computador, a produção artística e a ciência, para dessa maneira desenhar e atualizar a
contemporaneidade articulando em uma mesma síntese o conhecimento, a forma, o sentido e o
significado, ou seja, uma visão de mundo. Para o campo da dança, a relação que constitui essa
visão, traz uma ampliação das possibilidades já instauradas pela interface câmera filmadora
nos processos coreográficos contemporâneos. Com as múltiplas possibilidades do ambiente
virtual, é a própria noção de corpo que se reconfigura, já que esse ambiente não se submete às
mesmas leis científicas que regem o mundo. Sem, por exemplo, as limitações impostas pela
gravidade, o corpo que dança dispõe de uma liberdade quase super-humana, uma vez que ele
obedece apenas aos imperativos da imaginação.
São as relações que se estabelecem entre o corpo e os diversos meios pelos quais ele tem sido
representado que constituem a base da noção de corpo.
A inclusão de novas tecnologias digitais da imagem na dança tem transformado a
corporalidade dessa forma de arte. São softwares de criação/composição de movimentos e
notação coreográfica, câmeras de vídeo, telas de projeção, monitores LCD e de plasma,
sensores que dialogam com os dançarinos e, a partir do movimento, modificam em algum
aspecto os elementos cênicos, como a luz, o som, a imagem ou até o próprio corpo. Tornou-se
possível assistir a cenas de espetáculos em ângulos inesperados ou a distância. Com as
imagens se valorizam aspectos do gestual minimalista que, a depender da distância, antes não
eram possíveis de se enxergar; também se torna viável a criação de videocenografias e obras
de dança feitas especificamente para o vídeo e para o cinema.
Nesse contexto, conhecimentos de outras áreas passam a fazer parte do cotidiano da dança,
trazendo transformações para a realização coreográfica. A introdução de outros conhecimentos
também nos faz reposicionar o corpo que dança frente a sua própria corporalidade.
No momento em que o uso das tecnologias interfere na corporalidade ou simula movimentos
de um dançarino, amplia-se o conhecimento sobre a relação “dança/corpo” para
“dança/corpo/tecnologia”, uma simbiose que questiona a prática e a técnica de dança. Percebese
aí uma mudança no modo de organização em que a dança está estruturada, construindo um
pensamento diferente sobre ela própria, neutralizando a hierarquia segundo a qual o corpo
teria privilégio sobre outros elementos cênicos; todos eles agora estão implicados numa codependência,
cuja relação é mediada pela tecnologia, o que não era postulado antes pela dança
moderna ou pelo balé clássico.
As novas tecnologias movimentam e transformam as fronteiras entre os humanos,
diferenciando a experiência imediata suportada por sua corporeidade biológica, e a experiência
mediada por artefatos tecnológicos, que trazem para o pensamento da dança paradoxos como
presença/ausência, real/simulacro, próximo/longínquo. Importante salientar que essas já são
mudanças perceptíveis que essas tecnologias trazem para a arte da dança; a mediação
condiciona uma relação de troca de informações entre duas ou mais instâncias distintas
simultaneamente; a ideia de uma mediação também carrega no seu conceito a possibilidade de
transformação das partes envolvidas.
Na mediação está implícita a possibilidade de ação e reação para ambas as partes envolvidas, a
possibilidade de experimentar o que não estava programado também estrutura essa ideia,
reelaborando a relação e a interação entre o homem e seu ambiente e entre o homem e a
máquina. Os dispositivos que mediam a ação mandam ações de volta para o pensamento em
forma de fluxos de comunicação. Na mediação, surgem importantes rupturas que impedem os
envolvidos de permanecerem os mesmos, uma vez que são impulsionadas pela velocidade que
as transformações tecnológicas imprimem no cotidiano. A mediação (re)configura corpos,
hábitos, valores, crenças, domínios, limites.
As novas tecnologias da comunicação, ao serem mediadas pelo corpo, transportam nossa ação,
intenção e inteligência para dentro da máquina, dissolvendo contornos fixos no diálogo do
homem com as máquinas. A mediação é processo de dissolver fronteiras que distanciam
homem e máquina; é uma zona de troca de informações e transformações no momento em que
ela ocorre.
As novas tecnologias da imagem estabelecem estéticas corporais por meio de ações físicas;
interfaces interativas mediam esse panorama que urge nos domínios da tecnologia, da dança e
da junção “dança e tecnologia”. Antes de esclarecer a noção de interface, passearemos pelo
entendimento de mediação, com o qual está intimamente ligada. A mediação é um processo
desencadeado pela interface e configura experiências corporais, traduzidas em configurações
estéticas.
As mediações dissolvem as fronteiras que separavam o orgânico do inorgânico, natureza e
cultura, presença e ausência, realidade e simulação, longe e próximo, o corpo da técnica. Esses
conceitos que determinam a comunicação perdem a sua totalidade ao estarem cada vez mais
implicados na mediação tecnológica.
A mediação atua nas zonas fronteiriças que impõem limites entre instâncias, como a relação
corpo-máquina, em que cada um desses componentes podem ser diferenciados pelos seus
componentes constituintes. As “fronteiras” às quais nos referimos são movimentadas pela
efetiva relação da dança junto às novas tecnologias da imagem, essas margens que delimitam
os organismos maquínicos e humanos não obedecem aos limites que os definiam outrora os
conceitos de humano ou do que não é humano, na verdade, ultrapassar esses limites agora
fazem parte da experiência imediata da corporalidade orgânica, estimulada pelos artefatos
tecnológicos.
A tecnologia aqui apresentada não compartilha do seu uso como ferramenta ou instrumento a
serviço de algo, pois essa ideia não engendra pensamentos criativos que possam transformar o
corpo e nem colabora para diminuir o coletivo pensamento cartesiano que permeia nossa
cultura. É com a intenção de construir um modo diferenciado no aprendizado e uso sobre a
tecnologia e suas implicações nos esfacelamentos de fronteiras que envolvem corpo/tecnologia
que nos interessa o conceito de mediação. As novas tecnologias da imagem constroem
diálogos que mediam a relação do corpo com seu meio sociocultural; sua inclusão na nossa
sociedade produz historicidade. A tecnologia, enquanto mediadora das relações, busca uma
“posição” em relação ao mundo, ao mesmo tempo em que proporciona trocas de informações
que possibilitam a transformação dos envolvidos.
Os artefatos tecnológicos que mediam o corpo afetam as funções mentais simplesmente pela
possibilidade de ação e de experiência corpórea, que não era prevista anteriormente. Esses
artefatos geram pensamentos que são coerentes com suas respectivas funções; na mediação
emergem as rupturas que não partilham da noção de tradição, porque consequentemente os
hábitos aliados a uma prática tradicionalista cotidiana são ressignificados através de novas
experiências, provocadas pelos meios tecnológicos. As rupturas se apóiam na transitoriedade
dos corpos, valores, éticas, hábitos, crenças e nossos próprios limites físicos e sociais.
Laboratórios que pesquisam Inteligência Artificial realizam projetos que estimulam a
cognição, simulando processos que relacionam a mente humana e os artefatos tecnológicos.
Essas pesquisas não tratam a tecnologia como uma ferramenta, elas problematizam o uso da
tecnologia, para a criação de conhecimento, dissolvendo a nitidez dos contornos que
delimitam o orgânico e o inorgânico. A mediação, nesse caso, altera o conhecimento que se
tem das extremidades envolvidas, através de contato e de trocas com o meio, explora limites
do pensamento/corpo e da máquina em questão para identificar comportamentos que sejam
pertinentes, traduzidos em complexidades.
As pesquisas em Inteligência Artificial vasculham a mente humana, tentando torná-la visível,
manipulável e experimentável nos distintos circuitos que o pensamento percorre; a mediação
do corpo pelas tecnologias virtuais faz com que esse tipo de abordagem seja realizável via
experimentação corpórea.
By Profª Julia C. Coelho